Ela estava sentada de frente para a grande janela de sua sala olhando para a paisagem lá fora, às quatro da tarde de uma quarta-feira, pensando porquê ela estava em casa, apesar de estar de férias. Chovia e ventava muito, mas há muito tempo ela sabia que não era feita de açúcar. As férias não haviam saído como ela havia planejado, mas ela precisava daquele tempo para repor as baterias, para descansar, ficar um tempo longe do trabalho, das infindáveis preocupações de todos os dias...era preciso ter um tempo para ficar de bobeira, fazendo nada, mas de forma consciente, sem se preocupar com o que estava para acontecer no dia seguinte.
Não conseguira planejar uma viagem. Então acabou ficando em sua cidade mesmo, sem dramas. Na cabeça, um pensamento insistia em voltar: por que ele sumiu? Por que não deu mais notícias? Por que ninguém mais fala nele? Nem parecia que ele estava para voltar...
Com estes pensamentos insistentes em sua cabeça, ela começou a se questionar sobre os seus padrões: por que será que ela sempre insistia nos mesmos caras, nos mesmos tipos? Por que sempre se interessava por aquele cara enigmático, com tão pouco amor e carinho para oferecer? Era sempre o cara mais velho, mais bonito, mais inatingível!
Será que este era o padrão: gostar de quem é inatingível? Muitas vezes, ela se perguntou se este era um problema que só ela possuía, que talvez, em seu lugar, a maioria das mulheres já tivesse desistido há muito tempo de um cara como este. Mas, ela não, ela continuava sentindo saudades dele, fantasiando uma vida juntos, como namorados, como amantes, nem ela sabia mais de que forma.
Será que todas as mulheres sempre seguem um determinado padrão para buscar seus homens? Há aquelas que buscam os desprotegidos; outras querem alguém que as proteja. Algumas buscam um homem para competir, outras um eterno romântico, tem também aquelas que não suportam “grude”, sentem-se perseguidas, enaltecidas, endeusadas e odeiam isso. Enfim, todas buscam um padrão: seja um homem mais forte, ou mais fraco; mais romântico, ou mais frio; mais doce, ou mais rude. E eles? Também estão atrás de um padrão de mulher ou querem apenas ter ao seu lado uma mulher com quem possam testar a sua virilidade?
Eram muitas perguntas sem resposta. Do lado de fora, o tempo piorava. Ela então decidiu que, se era para continuar sozinha e em casa, teria que buscar alguma companhia. Acendeu um cigarro e abriu uma garrafa de vinho tinto... seco. Ficou saboreando o vinho, pensando, ao mesmo tempo, que sem o maldito tabagismo talvez ela pudesse apreciá-lo muito mais. No fundo, no fundo, queria afastar da cabeça mais um pensamento estranho que insistia em perturbá-la: qual seria o padrão de mulher dele agora? Como seria esta tal namorada que o faz tão feliz atualmente? E por que é tão difícil conviver com o fato de que ele não está mais sozinho e está muito feliz – sem ela?
Durante muito tempo, foi difícil ter que assumir que ele era gato, que estava no auge da idade, apesar de dez anos mais velho, e que muitas mulheres ficaram interessadas nele quando souberam que ele era o mais novo solteiro da praça. Foi difícil ter que competir com todas elas, e mesmo quando ela percebeu que era a “dona do pedaço”, não soube como agir, nem como afastar estas predadoras vorazes. Rapidamente, ela o perdeu, ou pelo menos perdeu o encantamento.
De fato, ele não soube lidar com a insegurança dela, buscava alguém que estivesse disposta a tudo, que fosse com ele para onde a vida mandasse, sem medos, dúvidas ou questionamentos. O futuro, nós construímos, ele dizia. Ela o perdeu, sem sequer tê-lo tido. Foi tudo muito rápido. Quando ele se foi, ela pensou que fosse perder o chão, que a vida fosse acabar. Hoje ela estava ali, pensando em como ia ser quando ele voltasse, no quanto isso ia mexer com os seus instintos femininos, o quanto ia doer vê-lo com outra pessoa e feliz.
O cigarro acabou, ela acendeu outro. O silêncio só não era absoluto porque ela podia ouvir o barulho do vento forte e da chuva batendo na enorme janela. Repôs o vinho em sua taça de cristal e ficou ali, bebericando. O futuro, nós construimos, ela repetiu... e pegou o telefone.
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