domingo, novembro 25, 2012

Vazio


Estava lá, vivendo no vazio. Sem gravidade, sem dor, sem som, sem nada. Só a luz das estrelas, do iluminado refletido pelo Sol.

Dormia de vez em quando. Sonhava até. Sonhava com os mortos. Eles vinham para assombrá-lo e dizer tudo que ele tinha se recusado a ouvir na encarnação anterior. Ou seria ele quem estava morto e os demais eram os vivos? Não sabia mais.

Sentia o quanto tinha sido tóxico com os outros. Não poupou verdades àqueles que as mereciam, mesmo que estas verdades os fizessem sofrer. Era bom vê-los sofrer. E agora, lá estava ele, sozinho, no vazio.

De vez em quando, sentia um aperto no peito, um aperto enorme, algo que ele, muito depois, foi definir como angústia. Uma angústia que ele não sabia de onde surgia, por que surgia. Era como se ele se culpasse dos seus erros terrenos. Mas, teria sido mesmo na Terra que ele passou seus últimos anos? Há quanto tempo estava ali no espaço vazio, vagando, perdido, sem rumo?

Já não tinha noção do tempo. Não via para onde voltar. Nunca pudera dar tanto valor ao conceito de porto seguro. Para porto, precisa ter mar. Sentia falta do mar, da água, do gosto da água em seus lábios. Agora, que prescindia das coisas mais simples, conseguia perceber o quanto havia valorizado o que não tinha valor. O que tinha valor era o calor, a água, o contato com a terra, com a areia, com a grama... que ele outrora odiava.

Tinha sido rabugento demais, arrogante demais, intolerante... E estava ali, no vazio.

Lembrava-se do carroussel de outrora, do qual ele tanto gostava. Lembrava-se de sua mãe, e do tempo em que se sentia amado por ela. Não foi sempre assim. Houve um tempo, depois de adulto, em que gostava de torturá-la. E, aos poucos, ela foi deixando de aparecer. Depois, ele esqueceu a data de seu aniversário. E vice-versa. Até que ele passou a saber dela apenas pelas redes sociais.

E agora, depois do salto, lá estava ele, no vazio.

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