Acordou de bom humor, iluminada pelo sol que inundava seu quarto pela janela. Tinha deixado tudo preparado no dia anterior. Como era muito lenta pela manhã, precisava que bolsa, sapatos e roupa estivessem arrumados para que conseguisse se aprontar e tomar o táxi no horário marcado.
De repente, sentia que havia deixado de ser "junior". Muito tempo depois de ter assumido o cargo de "pleno", ela sentia que agora, já um pouco mais velha, a senioridade batia à sua porta, e as responsabilidades, associadas a uma boa dose de autonomia, estavam finalmente permitindo que ela mostrasse ao que veio.
Sentia-se plenamente estimulada por estar se preparando para fazer algo fora da rotina. Tomar um outro caminho, em uma direção diferente, estar de frente pra praia, a mesma praia que ela freqüentou durante a juventude e que agora lhe era tão distante e, ao mesmo tempo, saudosa, ..., era tudo que ela queria. Pensava nos ônibus que teve que enfrentar em busca de um bronzeado jamais conquistado - porque era um dia de praia e dois de preguiça durante as férias naquele tempo. Mas, era bacana. As companhias eram legais, o programa, que às vezes soava como furado, tinha sempre um quê de diferente e algumas histórias para contar. Ela, que era muito observadora e se tornava cada dia mais, estava sempre atenta a tudo, ao mundinho da praia, a galera do ônibus, ao motorista, ao trocador e, principalmente, à paisagem que via no caminho e que ela adorava.
De repente, no meio do dia, o inesperado. Voltar para o mundo real, para atender a compromissos de última hora. Tudo bem, faz parte do jogo. Olhar para aquele contexto e de repente sentir que aquilo tudo era a coisa mais certa que ela podia estar vivendo nos últimos tempos foi como beber um bálsamo em pleno deserto e sentir-se plena de felicidade por míseros instantes.
Como nem tudo é perfeito, e o mundo real faz questão de deixar suas marcas (nem que seja pela percepção de um sorriso esperado e querido que não veio em sua direção, ou de um olhar atravessado), ela se viu imersa na tentativa de curar pequenas cicatrizes, resultantes das farpas das pequenas mentiras que insistimos em contar quando sabemos que a grandes verdades - as nuas e cruas - dóem demais. Foi dormir com elas, rogando para que o sono e o inconsciente lhe fizessem o favor de absorvê-las, minimizando seus efeitos, tornando-a mais forte e capaz de lidar com cicatrizes mais profundas que são como pregos na tábua da alma.
E, do mesmo modo que configurou seu humor em função da luz solar e divina no dia anterior, sofreu o resultado da mudança de fase da lua, mulher de fases que é, como todas as mulheres do planeta. E acordou sutilmente amoada, perturbada pelo peso da linda bola branca no céu, a iluminar seres crepusculares, que não dormem, não descansam nunca, e fazem da madrugada o seu refúgio, no qual tentam lidar com inseguranças e incertezas milenares.
E retornou à sua rotina sem ânimo nem disposição para guerrear, totalmente a fim de entregar os pontos, render-se ao inimigo e jogar a toalha. Ainda bem que um dia assim tem menos de 24 horas. Passa lento e rápido ao mesmo tempo, se te permites viver ao sabor do vento.
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