segunda-feira, outubro 10, 2011

A um amigo descrente

Meu amigo,

Vi que você está descrente da vida. Que é chegada a hora de repensar suas escolhas. Que, depois de tudo o que você fez, de tudo que você investiu, você acha que não recebeu o reconhecimento merecido.

Pode não parecer, mas eu sei bem pelo quê você está passando. Não que eu tenha enfrentado situação igual, mas vi meu pai sofrer na pele a crise da Construção Civil, na década de 1980. Ele, profissional dedicado, projetista que participou de grandes projetos como a construção da Usina Hidrelétrica de Itaipú, de repente, teve que se reiventar. Reconheço nas suas palavras a tristeza que via no olhar do meu pai, uma tristeza recheada de preocupação, aquela preocupação que os homens têm ao se deparar com a dura realidade de não saber como botar dinheiro em casa e sustentar a família.

A palavra é essa, meu amigo: Reinvenção. Você precisa se descobrir. Tirar esse tempo, ou algum tempo, para olhar para dentro e descobrir do quê você ainda gosta de fazer. Pensar em outras possibilidades, olhar para o lado, buscar por analogias, ser criativo. Esquecer um pouco talvez daquilo que você mais domina e pensar no quê você poderia investir para começar de novo.

Sim, amigo, porque nunca é tarde para começar de novo. Você mesmo, já recomeçou tantas vezes, já venceu batalhas duríssimas, essa é só mais uma. Pense assim: "um dia ainda vou dar muita risada de tudo isso" ou "como eu cresci naquele tempo em que eu achava que não tinha nenhuma perspectiva".

Sim, porque você tem perspectivas, poder até parecer que não, mas tem. Essas perspectivas, você as cria, tenho certeza, você se remodela, se molda a outro negócio, se inspira em outros caminhos... É só começar, é só sair da inércia, que tudo dará certo.

Use seu tempo para escrever no seu blog. Escreva tudo aquilo em que você acredita. Escreva para deixar como legado tudo aquilo que você viveu como executivo. Vai ser bom pra você. Mas, antes, sacode a poeira da melancolia e respira fundo. Encare tudo isso como uma viagem, uma viagem ao seu mundo interior.

Todos nós vivemos crises em setênios. Elas vêm, de sete em sete anos, para nos fazer repensar a vida. Em ciclos de sete em sete anos, não necessariamente numa idade exata, mas pelo menos uma vez, nos deparamos com algumas questões clássicas. E são essas questões que nos impulsionam, nos fazem caminhar, nos levam adiante. É o ciclo da vida, como diz a Antroposofia.

Aos sete, quando aprendemos a ler e escrever e descobrimos um mundo novo. Aos catorze, com os nossos hormônios em ebulição. Aos vinte e um, quando entramos na idade adulta e nos vemos lá, quase acabando a faculdade, nos deparando com a pergunta: E agora? Como será sair debaixo da asa dos meus pais?

Aos vinte e oito, já empregados, tendo que dar saltos quânticos na carreira para provar nossa competência. Aos trinta e cinco, quando, muitas vezes, assumimos a responsabilidade de gerenciar equipes. Aos quarenta e dois, quando começamos a sentir o peso da idade e da desaceleração de nosso metabolismo (e vemos o quão necessário são os exercícios físicos para nos mantermos saudáveis).

Aos quarenta e nove, quando começam a achar que estamos em declínio, apesar de nos sentirmos plenos e aptos para encarar qualquer desafio. E então, começamos a nos deparar com questões muito voltadas para a espiritualidade, porque a curva já está começando a declinar mesmo, o corpo está ficando frágil (ao pó voltaremos, não é mesmo?) e as questões da alma passam a ser muito mais importantes.

E quando estamos prontos para curtir a vida (quando nos aposentamos - se é que não curtimos antes), essas questões estão latentes: De onde eu vim? O que fiz da minha vida? Para onde eu vou? O que deixo de herança?

A minha dica para você, meu amigo, é só uma: não pense muito, não! Viva o presente. Mas, lembre-se de uma coisa. Quando estamos no avião, a aeromoça sempre diz, em seu briefing de segurança: "em caso de despressurização, máscaras de oxigênio cairão em sua direção. Coloque a sua máscara, ajuste o elástico e depois auxilie quem está ao seu lado"... Ou seja, é tempo de cuidar de você, tempo de olhar para você, e pensar que talvez haja ao seu lado alguém de máscara pronto para te ajudar. Ah, e esse oxigênio metafórico está dentro de nós. Busque aí dentro a sua força, ela está aí, não se perdeu.

Sei que você vai conseguir.

Um beijo da amiga muito crente em você.
R.


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