Contamos com amigos, com nossos pais, e com nossos amores. Contamos emoções, contamos dias felizes. Contamos sorrisos, contamos lágrimas. Contamos detalhes, minúcias. Contamos com o que lembramos e de quem lembramos. Contamos nossas tristezas, e os queridos que já se foram. Contamos pros outros o que conta. E através das nossas memórias, contamos nossa história.
Contamos os dias que faltam: para a prova do Vestibular, para aquela grande reunião, para nossa primeira entrevista de emprego, para aquele encontro com o gatinho da faculdade, para o dia do nosso casamento, para o dia que veremos o rosto de nosso primeiro filho... estamos sempre contando. Acho que a ansiedade é um sentimento inerente ao ser humano: todos somos ansiosos, em maior ou menor medida. Enquanto esperamos, imaginamos o "como vai ser". Às vezes, a realidade nos brinda com magia, às vezes não. Imaginar o que se espera pode ser maior ou melhor do que viver o esperado.
Invejo aqueles que não contam, que não querem saber o que virá, que não pensam no passado, que amam o presente tão intensamente, como se fosse realmente uma dádiva de Deus, que tem que ser vivida plenamente, sem interferências.
O passado é uma distorção da nossa memória. Com o tempo, tendo que esvaziar nosso hard-disk interno, acabamos nos livrando do que dói, do que magoa, do que consideramos irrelevante. Sabe aquele dia em que a gente brigou com o motorista do ônibus por que ele deu uma freada brusca? Ah, deixa pra lá! O que é que eu ganho lembrando disso mesmo?
Já o futuro, o futuro é apenas um desejo. E tudo acontece tão diferente do que imaginamos. É aquela conversa decisiva que ensaiamos e que acaba sendo totalmente diferente do esperado. É aquela viagem planejada que acaba sendo meio atrapalhada, perde-se mala, paga-se excesso de bagagem, um transtorno só. É aquele show do nosso ídolo do rock que você espera a vida inteira e aí acaba a luz no meio do espetáculo e você lá sem saber se fica ou vai embora...
Eu conto essas histórias aqui no blog porque aprecio o registro. Sigo contando com os amigos do peito, e são eles que me dão os insumos pras histórias que conto. Gosto de visitar as memórias de tempos em tempos e de me dar conta de tudo que aprendi com elas. Gosto de lembrar das pessoas, e de me sentir acalentada com os comentários de quem realmente conta. Com o que escrevo, mato a saudade de um futuro que desconheço e encurto o tempo para fazê-lo presente.
2 comentários:
Rebecca, que espetáculo de texto bem escrito e inteligente. Adorei o tema e a maneira como o apresentou. Você disse tantas verdades por aqui... pra que ficar remoendo algo que já passou? Não vai voltar mesmo! Pra que ficar desesperado, ansioso, imaginando o que vai acontecer amanhã? E o hoje, onde fica?!
Grande beijo!
** Queria segui-la, mas vi que vc não tem o recurso!
Rebecca consegue dizer aquilo que a gente precisa ouvir, com profundidade e doçura. Que bom! Meu lado ansioso muitas vezes atrapalha o viver as minhas histórias. Meu resgaste são os contos, as poesias e a terapia. E o recomeçar é a minha maior esperança. Por isso vejo cada dia como uma nova história que começa e um novo tempo a se contar.
E isso ajuda demais.
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