sexta-feira, outubro 09, 2009

Um estado de entorpecimento

Estou exausta. Preparar uma viagem e um evento ao mesmo tempo, com uma apresentação diferente sobre um tema novo, foi quase como correr uma maratona por dia, ao longo de uma semana. O cansaço me deixou assim, neste estado de entorpecimento.

Melhor teria sido usar alguma droga pra me desligar do mundo, dormir bastante, descansar, mas sou medrosa até pra isso. Tenho pânico de qualquer efeito colateral que possa me fazer perder o controle. Eu não gosto da idéia de perder o controle. Nunca. Por isso não bebo. E se 'viajo', é completamente lúcida, sempre. Minha música tinha que ser "Lúcida num céu de diamantes"...

No meio desse cansaço todo, eu fui apenas eu. Uma moleca, como ouvi hoje, que gargalha, brinca, conta piada e quer ver o povo sorrir. Eu fui gregária, afetuosa, me diverti.

Durante esta semana, disse muito com muito pouco, mais com gestos, que com palavras, e não disse metade do que gostaria de ter dito. Fiquei com uma verdade entalada na garganta, porque tem gente nessa vida que tem sempre o discurso certo e a artimanha mais incrível pra não nos deixar falar. Pede a palavra e quando a gente quer usar o direito a réplica, simplesmente, não escuta.

Se eu tivesse dito, talvez a minha verdade doesse. E eu, que dizem por aí, sou alguém que não sabe ouvir, acabei dizendo o que não disse, porque teve gente que ouviu demais. Ouviu o que queria ouvir e não o que eu estava a dizer. Se colocou num papel que eu nunca imaginei para ele. Só para sair pela tangente.

O que eu queria dizer é que a vida é risco. E mesmo que a gente seja inseguro, que queira ser querido e ser aceito, que tenha certa dificuldade em externalizar as emoções, a gente corre risco o tempo todo. Pode ser até que a gente não queira um risco muito grande pra nós, e por isso viva uma vida simplesinha, mas só o fato de estarmos vivos, agradecendo ou não a Deus pelos dons que nos foram dados, já implica em risco.

O maior risco de todos é o de gostar muito, mais do que na média. A gente gosta porque gosta, como disse um conhecido meu. É involuntário, não há como escolher. E gostar implica em ter preferências. Ter preferências é reconhecer que você aprecia mais determinadas características que uma pessoa tem em relação a outra. Virtudes, caráter, simplicidade, humildade, algumas coisas que as pessoas esqueceram que são relevantes. Gostar de alguém é confiar que aquela pessoa nunca vai te trair, vai ser fiel a uma relação (seja ela qual for, não necessariamente uma relação homem-mulher) que vocês estão construindo juntos... E quando eu falo em trair, falo nas pequenas coisas. Ou talvez das coisas mais importantes, as maiores.

Falo na fidelidade da amiga, que é sua confidente. Falo na cumplicidade do amigo, que te dá conselhos, te oferece um ombro pra chorar. Falo na parceria, na amizade, no olho-no-olho. Falo daquilo que não precisa ser dito, mas que também não será inventado (ou seja, você não vai dizer e o outro, que está do outro lado da linha telepática, vai entender direitinho, só de olhar pra você).

Gostar é querer reciprocidade. E a gente sabe, por mais doloroso que seja, que nem sempre isso é possível, porque gostar não é mensurável, nem comparável. Não dá pra gerenciar. Quando a gente gosta, não há como por o sentimento na balança e saber se você gosta mais do outro do que o outro de você. Você quer um tratamento especial, de quem você trata de uma forma especial. Você quer exclusividade e tempo... ah, principalmente, você quer que o outro dedique parte do seu tempo para estar só com você, mais ninguém. Se é pra somar, que seja com qualidade. Você não quer andar em bando, quer andar numa insustentável leveza...

E gostar é difícil de definir. Principalmente, para quem é intenso. Se gostar é querer ver o outro feliz, quem é intenso parece se esforçar mais para cumprir esta tarefa. Batalha, fica atento, pode-se dizer que pega até no pé. É um chato. Precisa estar o tempo todo se policiando para não exagerar. E 'exagerado', como dizia Cazuza, acredita que 'são precisas mil rosas roubadas pra descontar suas mentiras e mancadas'. Imagina, que exagero!

Se não disse, foi porque um anjo me cantou baixinho, num "carelless whisper" (é, coincidentemente, esta música estava tocando de novo) que não era hora de dizer. Meu interlocutor não entenderia. É gente que só vê o que quer ver. Se tenho muito que aprender, ele então... Quem sabe, não vamos acabar aprendendo um pouquinho que seja juntos?

A noite acabou em temporal. E quem discursou em tom solene, acabou preocupado. Se postergamos um papo franco, sabemos que um dia ele vai ter que acontecer. No dia da despedida, quando eu me livrar do medo e soltar o verbo, naquele que vai ser o dia da virada, quando eu mostrar quem eu sou de fato, em que eu resolver que é hora de entender o que não tem explicação, nem motivo, nem porquê. Nesse dia, aí sim, quem me olha nos olhos e busca sentido pro que diz, vai ter que mostrar muito gingado pra tomar o seu rumo e seguir adiante. Não vai terminar o discurso com o meu lema, não, apesar dele ser bom. "A vida é muito curta para ser pequena". E o 'pequena' aqui se refere à medíocre, pensando bem.

Nessa fim de noite, me pego pensando que para não ser medíocre, é preciso ter coragem pra botar contra a parede, falar sem rodeios. Dizer "eu sou assim, e daí, vai encarar?", sem medo que o outro se afaste, se acanhe, se encolha! Quem gosta do outro gosta de qualquer jeito, com defeitos, com as dificuldades, com as manhas, com os ataques de pití.

No dia dessa chamada derradeira, quem se esconde por trás dos discursos, terá que tirar a máscara e mostrar ao que veio. Nesse dia, meu coração terá um pouco de paz.

3 comentários:

O_PRG disse...

A vida é uma oportunidade de ousar - Clemenceau

cotrimus disse...

Tenho muito o que dizer sobre este post. Mas prefiro calar-me, muito já foi dito.
Só tenho uma pergunta: quando então?
bjs

Rebecca Leão disse...

Quando for a hora. "Temperança" é a carta. Bjs, Rebecca