Parou no boteco, escolheu uma mesa perto da entrada e sentou-se, displicientemente. Pediu uma dose de gim tônica, acendeu um cigarro que pousou delicadamente no pequeno cinzeiro nadir figueiredo trazido pelo garçom e que deixou queimar, e se perdeu numa desconstrução detalhada de sonhos e misérias pessoais.
De tempos em tempos, dava crédito à paisagem da Lapa, ao quadro movimentado de pessoas indo e vindo em pleno entardecer. Mas, era no balanço de sua vida que ela se entretinha, nas conquistas, nas perdas, nos aprendizados, nas escolhas... "E se?" era algo que ela não se permitia perguntar, mesmo sabendo no fundo de seu coração que havia um tempo em que tudo era mais fácil.
Tinha se tornado a pessoa mais segura e forte do mundo, aquela que os amigos admiravam e em quem se apoiavam, só que estava em frangalhos, em pedaços, catando os caquinhos e tentando tornar a ser aquela que, em essência, vinha tentando esconder nos recônditos de sua alma, intacta ao longo do caminho. "Quem sou eu agora?", ela se perguntava sem saber a resposta, enquanto tomava um gole, dava um trago comprido no cigarro e observava um casal a trocar juras de um amor bandido na mesa do lado. "Um dos dois é casado", ela concluiu pela conversa, descrente das pessoas e das relações humanas que estava.
"Por que tudo é tão difícil? Por que sempre queremos o que não podemos ter? É esse destino traçado, é aquilo que pedimos quando estamos chegando neste plano, tudo aquilo que devemos resgatar e aprender e, ainda assim, sofremos, nos desesperamos e não aceitamos uma dor que nós mesmos nos impomos... Desse livre arbítrio que temos, algumas decisões podem ser impensadas, são inaceitáveis pela maioria mas, de qualquer modo, são só nossas, e nós é que vamos prestar contas delas no final..."
O garçom, que observava aquela mulher a tocar a borda do copo com o dedo indicador, apoiando a cabeça em sua mão esquerda, ofereceu mais uma dose, que ela aceitou mas não bebeu.
O tempo passou e só Carolina não viu. Os últimos anos foram tão intensos. Tudo o que ela ganhou, tudo o que ela perdeu... no balanço, o saldo era positivo. Deitou a cabeça em trilhos algumas vezes, a esperar intensamente que um trem viesse de algum canto e pusesse um fim naquilo tudo, mas acabou por se surpreender com uma força inexplicável que havia dentro dela e que ela não sabia existir.
Ainda espera o milagre que a fará mãe, que lhe permitirá exercer a dádiva de ser mãe, de cuidar de um filho ou filha, de vê-lo crescer, aprender a falar, a andar, ouví-lo chamá-la de mãe, vê-lo brincar com os avós, gritar de fome, pedir para segurar a sua mão à noite... Ainda se sente patética por ter que explicar aos outros esse desejo, àqueles que acham que ela devia simplesmente aceitar a sua "incapacidade de gerar". Não, mesmo que seja destino, uma peça do acaso, ela não vai desistir...
"Em algum lugar, no fim do arco-íris, deve haver um pote de ouro onde eu vá, enfim, encontrar a minha criança..."
Sentiu as lágrimas escorrerem pelo seu rosto frágil e marcado de mulher madura e, como acredita que isso não combina com o espírito alegre e juvenil da noite carioca, pagou a conta e saiu.
segunda-feira, fevereiro 28, 2011
domingo, fevereiro 20, 2011
Quatro estações
O inverno é um vovozinho tiritante.
O outono, um tio solteirão.
A primavera, em compensação, é uma menina pulando na corda".
Mário Quintana
Para viver com poesia
Ah, primavera, chega logo!
quinta-feira, fevereiro 17, 2011
Coisas que eu amo...
Pois é, né, gente, eu sou normal, amo e odeio com a mesma intensidade. E amo um monte de coisas...
1) Carinho dos amigos;
2) Me permitir um picolé na hora do almoço, no calor escaldante do verão;
3) Ir à praia e ficar olhando o mar (praia vazia, de preferência);
4) Feijão - arroz - bife - batata-frita;
5) Dormir à tarde sem hora pra acordar;
6) Escurinho do cinema bem agarradinho ao meu amor;
7) Um carinho do homem que eu amo;
8) Chinelos, amo chinelos, tenho muitos!
9) Livros de ficção;
10) Trabalho desafiador;
11) Viajar, e descobrir novos lugares, cheiros e paladares;
12) Sentir que tem alguém pra cuidar de mim um pouquinho de vez em quando.
1) Carinho dos amigos;
2) Me permitir um picolé na hora do almoço, no calor escaldante do verão;
3) Ir à praia e ficar olhando o mar (praia vazia, de preferência);
4) Feijão - arroz - bife - batata-frita;
5) Dormir à tarde sem hora pra acordar;
6) Escurinho do cinema bem agarradinho ao meu amor;
7) Um carinho do homem que eu amo;
8) Chinelos, amo chinelos, tenho muitos!
9) Livros de ficção;
10) Trabalho desafiador;
11) Viajar, e descobrir novos lugares, cheiros e paladares;
12) Sentir que tem alguém pra cuidar de mim um pouquinho de vez em quando.
quarta-feira, fevereiro 16, 2011
Coisas que eu odeio...
As coisas que eu mais odeio na vida são:
1) Lidar com os que vêem qualquer coisa na tua mão (biscoito, jornal, revista...) e já vão logo dizendo: "eu quero"!
2) Aqueles caras que remexem o lixo na rua e deixam tudo sujo e fedorento, sem se importar com o trabalho dos lixeiros que têm que recolher tudo depois.
3) Suvaco molhado e fedido encostando em você no metrô lotado.
4) Banheiro de academia cheio de pelos, molhado, bagunçado.
5) Pia cheia de louça suja de manhã cedo (sou eu que lavo, né?).
6) Passar roupa nesse calor escaldante de verão.
7) Chegar em casa louca por um banho gelado e a água (que deveria ser fria) cair morna do chuveiro (porque a caixa d'água ficou no sol o dia inteiro).
8) Pergunta muito óbvia.
9) Demanda obscena de trabalho (seja por um prazo muito impossível, ou por um escopo muito irreal).
10) Gente impaciente no trânsito, gente molenga no trânsito, gente abusada no trânsito.
11) Gente que não entende "meias palavras".
12) Gente que tenta me fazer de otária.
E você?
1) Lidar com os que vêem qualquer coisa na tua mão (biscoito, jornal, revista...) e já vão logo dizendo: "eu quero"!
2) Aqueles caras que remexem o lixo na rua e deixam tudo sujo e fedorento, sem se importar com o trabalho dos lixeiros que têm que recolher tudo depois.
3) Suvaco molhado e fedido encostando em você no metrô lotado.
4) Banheiro de academia cheio de pelos, molhado, bagunçado.
5) Pia cheia de louça suja de manhã cedo (sou eu que lavo, né?).
6) Passar roupa nesse calor escaldante de verão.
7) Chegar em casa louca por um banho gelado e a água (que deveria ser fria) cair morna do chuveiro (porque a caixa d'água ficou no sol o dia inteiro).
8) Pergunta muito óbvia.
9) Demanda obscena de trabalho (seja por um prazo muito impossível, ou por um escopo muito irreal).
10) Gente impaciente no trânsito, gente molenga no trânsito, gente abusada no trânsito.
11) Gente que não entende "meias palavras".
12) Gente que tenta me fazer de otária.
E você?
terça-feira, fevereiro 08, 2011
segunda-feira, fevereiro 07, 2011
A "forte"
A "forte" estava com dor no peito hoje. Chegou na acupuntura e sofreu quando a terapeuta cravou a agulha no chacra do plexo solar. Tudo nela é angústia e ansiedade. Aos poucos, a dor foi se dissipando...
Dos colegas que a viram hoje, apenas um lhe segurou a mão, e depois lhe deu um abraço apertado. Os demais, como sempre, pediram à "forte" um sorriso, nem que breve. Pediram também um conselho, ou dois. Uma sugestão. Ela foi serena, plausível, racional, engraçada, e encantadora como faz todos os dias. Usou todas as máscaras que dispõe... algumas já tão incorporadas ao seu dia-a-dia, que ela já nem lembra mais como é ser ela mesma. Mas, ela é a "forte", e veio à este mundo para apoiar, suportar, dar força, oferecer um ombro amigo, dar coragem, ela não desiste nunca.
Quando à tarde lhe ofereceram um carinho, ela ficou emocionada só pela oferta...
Foi pra ela uma benção chegar em casa e encontrar um ramalhete de flores de sua irmã. O bilhetinho dizia assim:
"Minha irmã,
pode não ter sido agora, mas vai acontecer!
Lembre-se: tudo, tudo, tudo vai dar pé.
Estou na torcida!
Amo você. Beijos".
Obrigada, minha irmã. Eu também te amo.
Dos colegas que a viram hoje, apenas um lhe segurou a mão, e depois lhe deu um abraço apertado. Os demais, como sempre, pediram à "forte" um sorriso, nem que breve. Pediram também um conselho, ou dois. Uma sugestão. Ela foi serena, plausível, racional, engraçada, e encantadora como faz todos os dias. Usou todas as máscaras que dispõe... algumas já tão incorporadas ao seu dia-a-dia, que ela já nem lembra mais como é ser ela mesma. Mas, ela é a "forte", e veio à este mundo para apoiar, suportar, dar força, oferecer um ombro amigo, dar coragem, ela não desiste nunca.
Quando à tarde lhe ofereceram um carinho, ela ficou emocionada só pela oferta...
Foi pra ela uma benção chegar em casa e encontrar um ramalhete de flores de sua irmã. O bilhetinho dizia assim:
"Minha irmã,
pode não ter sido agora, mas vai acontecer!
Lembre-se: tudo, tudo, tudo vai dar pé.
Estou na torcida!
Amo você. Beijos".
Obrigada, minha irmã. Eu também te amo.
Baile de máscaras...
This Masquerade
George Benson
Are we really happy here
With this lonely game we play
Looking for words to say
Searching but not finding
understanding anywhere
We're lost in a masquerade
Both afraid to say we're just to far away
From being close together from the start
We tried to talk it over but the words got in the way
We're lost inside this lonely game we play
Thoughts of leaving disappear
Every time I see your face
No matter how hard I try
To understand the reasons
Why we carry on this way
We're lost in a masquerade
George Benson
Are we really happy here
With this lonely game we play
Looking for words to say
Searching but not finding
understanding anywhere
We're lost in a masquerade
Both afraid to say we're just to far away
From being close together from the start
We tried to talk it over but the words got in the way
We're lost inside this lonely game we play
Thoughts of leaving disappear
Every time I see your face
No matter how hard I try
To understand the reasons
Why we carry on this way
We're lost in a masquerade
domingo, fevereiro 06, 2011
Passado, presente e futuro
"Não se vive no presente. E é daí que vem os nossos problemas. Vivemos, na maior parte do tempo, em alguma saliência do passado. O hoje não existe na realidade. E o amanhã desaparece antes mesmo de nascer".
Martin Page
A gente se acostuma com o fim do mundo, 2007
Quanto mais eu leio os livros do Page, mais eu me identifico com eles. Ele escreve ficção de uma forma peculiar, como se estivesse traduzindo, nos seus livros pra lá de melancólicos, a agonia de toda uma geração, a minha. É uma geração que sofre, que complica as coisas, que enxerga as coisas simples da forma mais complexa que pode haver, antes mesmo que elas comecem a existir.
O futuro é algo que depende profundamente da nossa imaginação, do que queremos pra nós. Acho que, pra ajudar, precisamos ter fé. Fé em alguma coisa. Tá bom, a gente pode até não acreditar em Deus, mas, precisamos ao menos, acreditar em nós mesmos.
O mais complicado é que a gente tem a mania de se apegar a algo, a Deus, a uma religião, ou a qualquer coisa, quando está tudo muito ruim. Daí a gente se queixa, se sente infeliz, fica com uma tremenda

Este ano, eu decidi que seria o meu ano da virada, que eu ia conseguir realizar um grande sonho. Não vai ser tão fácil como pareceu no início, mas eu estou firme, só me dou por vencida depois que ele se realizar. Depois do primeiro revés, eu fui lá conversar com Ele, na casa dEle, pra pedir a ele que me permita compreender as lições dessa vida, que me dê serenidade pra aceitar o que eu não compreendo, e que me dê perseverança para continuar tentando, que me permita essa benção. Mas, eu fui prioritariamente, agradecer a oportunidade de tentar, porque eu sei que tem gente que nem essa chance tem.
Quando eu olho pro passado, e penso no que eu poderia ter feito melhor, vejo que a maior dificuldade é lidar com a culpa, uma culpa que não necessariamente é minha. Às vezes, a gente faz escolhas que mudam o nosso destino, e foi isso que eu fiz. Posterguei tudo que eu podia na minha vida pessoal para dar espaço para a vida profissional, e agora tive que dar às

Esse potencial de futuro, a gente que constrói. Feliz ou não, alegre ou não, são as nossas escolhas nesse hoje que não é real, que vão construir o futuro potencial, o futuro virtual que a gente imagina. Por isso que o segredo daquele livro, aquele que ficou famoso, é pensar positivo. Porque...
"...você tem que ter cuidado com o que deseja. Pode acabar por conseguir".
domingo, janeiro 30, 2011
PAZ
Minha Alma (A Paz Que Eu Não Quero)
O Rappa
Composição: Marcelo Yuka
A minha alma tá armada e apontada
Para cara do sossego!
(Sêgo! Sêgo! Sêgo! Sêgo!)
Pois paz sem voz, paz sem voz
Não é paz, é medo!
(Medo! Medo! Medo! Medo!)
As vezes eu falo com a vida,
As vezes é ela quem diz:
"Qual a paz que eu não quero conservar,
Prá tentar ser feliz?"
As grades do condomínio
São prá trazer proteção
Mas também trazem a dúvida
Se é você que tá nessa prisão
Me abrace e me dê um beijo,
Faça um filho comigo!
Mas não me deixe sentar na poltrona
No dia de domingo, domingo!
Procurando novas drogas de aluguel
Neste vídeo coagido...
É pela paz que eu não quero seguir admitindo
É pela paz que eu não quero seguir
É pela paz que eu não quero seguir
É pela paz que eu não quero seguir admitindo
--------------------------------------------------------------------
Veja o vídeo aqui.
O Rappa
Composição: Marcelo Yuka
A minha alma tá armada e apontada
Para cara do sossego!
(Sêgo! Sêgo! Sêgo! Sêgo!)
Pois paz sem voz, paz sem voz
Não é paz, é medo!
(Medo! Medo! Medo! Medo!)
As vezes eu falo com a vida,
As vezes é ela quem diz:
"Qual a paz que eu não quero conservar,
Prá tentar ser feliz?"
As grades do condomínio
São prá trazer proteção
Mas também trazem a dúvida
Se é você que tá nessa prisão
Me abrace e me dê um beijo,
Faça um filho comigo!
Mas não me deixe sentar na poltrona
No dia de domingo, domingo!
Procurando novas drogas de aluguel
Neste vídeo coagido...
É pela paz que eu não quero seguir admitindo
É pela paz que eu não quero seguir
É pela paz que eu não quero seguir
É pela paz que eu não quero seguir admitindo
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Veja o vídeo aqui.
sábado, janeiro 29, 2011
Para ver estrelas

As estrelas não foram feitas para serem tocadas. Se alguém lhe oferecer uma, desconfie, jogue-a fora com força, para bem longe, para que ela reencontre seu lugar no ventre do céu. Não se ganha nada de graça, ao menos nada que seja ao mesmo tempo puro e brilhante...
Martin Page
A gente se acostuma com o fim do mundo
2007
sexta-feira, janeiro 28, 2011
Salvador Dalí
terça-feira, janeiro 25, 2011
Vale tudo?
Está bombando no Canal Viva...
Vale Tudo!
Uma novela com uma abertura dessas, com essa música, com Lídia Brondi em sua última novela, Beatriz Segal como Odette Roitman e a Renata Sorrah como Heleninha é definitivamente imperdível!
Vale Tudo!
Uma novela com uma abertura dessas, com essa música, com Lídia Brondi em sua última novela, Beatriz Segal como Odette Roitman e a Renata Sorrah como Heleninha é definitivamente imperdível!
Tofu Studio

Chapéu Catherine
Meninas, vejam que lindos esses produtos! Meninos, vejam que idéias originais para presentes! São da Tofu Studio, que você pode conhecer AQUI. Nossa, tem cada coisa bacana na internet!
domingo, janeiro 23, 2011
Mais da Martha
A DOR QUE DÓI MAIS
Martha Medeiros
Trancar o dedo numa porta dói. Bater com o queixo no chão dói. Torcer o tornozelo dói. Um tapa, um soco, um pontapé, dóem. Dói bater a cabeça na quina da mesa, dói morder a língua, dói cólica, cárie e pedra no rim. Mas o que mais dói é saudade.
Saudade de um irmão que mora longe. Saudade de uma cachoeira da infância. Saudade do gosto de uma fruta que não se encontra mais. Saudade do pai que já morreu. Saudade de um amigo imaginário que nunca existiu. Saudade de uma cidade. Saudade da gente mesmo, quando se tinha mais audácia e menos cabelos brancos. Dóem essas saudades todas.
Mas a saudade mais dolorida é a saudade de quem se ama. Saudade da pele, do cheiro, dos beijos. Saudade da presença, e até da ausência consentida. Você podia ficar na sala e ele no quarto, sem se verem, mas sabiam-se lá. Você podia ir para o aeroporto e ele para o dentista, mas sabiam-se onde. Você podia ficar o dia sem vê-lo, ele o dia sem vê-la, mas sabiam-se amanhã. Mas quando o amor de um acaba, ao outro sobra uma saudade que ninguém sabe como deter.
Saudade é não saber. Não saber mais se ele continua se gripando no inverno. Não saber mais se ela continua clareando o cabelo. Não saber se ele ainda usa a camisa que você deu. Não saber se ela foi na consulta com o dermatologista como prometeu. Não saber se ele tem comido frango de padaria, se ela tem assistido as aulas de inglês, se ele aprendeu a entrar na Internet, se ela aprendeu a estacionar entre dois carros, se ele continua fumando Carlton, se ela continua preferindo Pepsi, se ele continua sorrindo, se ela continua dançando, se ele continua pescando, se ela continua lhe amando.
Saudade é não saber. Não saber o que fazer com os dias que ficaram mais compridos, não saber como encontrar tarefas que lhe cessem o pensamento, não saber como frear as lágrimas diante de uma música, não saber como vencer a dor de um silêncio que nada preenche.
Saudade é não querer saber. Não querer saber se ele está com outra, se ela está feliz, se ele está mais magro, se ela está mais bela. Saudade é nunca mais querer saber de quem se ama, e ainda assim, doer.
___________________
Cara, ela disse tudo com esse texto.
Martha Medeiros
Trancar o dedo numa porta dói. Bater com o queixo no chão dói. Torcer o tornozelo dói. Um tapa, um soco, um pontapé, dóem. Dói bater a cabeça na quina da mesa, dói morder a língua, dói cólica, cárie e pedra no rim. Mas o que mais dói é saudade.
Saudade de um irmão que mora longe. Saudade de uma cachoeira da infância. Saudade do gosto de uma fruta que não se encontra mais. Saudade do pai que já morreu. Saudade de um amigo imaginário que nunca existiu. Saudade de uma cidade. Saudade da gente mesmo, quando se tinha mais audácia e menos cabelos brancos. Dóem essas saudades todas.
Mas a saudade mais dolorida é a saudade de quem se ama. Saudade da pele, do cheiro, dos beijos. Saudade da presença, e até da ausência consentida. Você podia ficar na sala e ele no quarto, sem se verem, mas sabiam-se lá. Você podia ir para o aeroporto e ele para o dentista, mas sabiam-se onde. Você podia ficar o dia sem vê-lo, ele o dia sem vê-la, mas sabiam-se amanhã. Mas quando o amor de um acaba, ao outro sobra uma saudade que ninguém sabe como deter.
Saudade é não saber. Não saber mais se ele continua se gripando no inverno. Não saber mais se ela continua clareando o cabelo. Não saber se ele ainda usa a camisa que você deu. Não saber se ela foi na consulta com o dermatologista como prometeu. Não saber se ele tem comido frango de padaria, se ela tem assistido as aulas de inglês, se ele aprendeu a entrar na Internet, se ela aprendeu a estacionar entre dois carros, se ele continua fumando Carlton, se ela continua preferindo Pepsi, se ele continua sorrindo, se ela continua dançando, se ele continua pescando, se ela continua lhe amando.
Saudade é não saber. Não saber o que fazer com os dias que ficaram mais compridos, não saber como encontrar tarefas que lhe cessem o pensamento, não saber como frear as lágrimas diante de uma música, não saber como vencer a dor de um silêncio que nada preenche.
Saudade é não querer saber. Não querer saber se ele está com outra, se ela está feliz, se ele está mais magro, se ela está mais bela. Saudade é nunca mais querer saber de quem se ama, e ainda assim, doer.
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Cara, ela disse tudo com esse texto.
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