quinta-feira, fevereiro 26, 2009

Carros de vidro preto e a perda da inocência

Hoje eu fui à Barra da Tijuca, fazer um passeio diferente. Raramente, eu e meu marido vamos até lá, ou porque achamos muito longe, ou porque temos acesso à muito do que há por lá bem mais perto, ou porque não temos vontade.

Mas cada vez que vamos, vejo as novidades e me surpreendo. Aquilo lá não pára de crescer, para todos os lados. Os condomínios estão cada vez mais bonitos e os espaços, cada vez mais ocupados. Ficamos horrorizados com a Cidade da Música. Pode ser que um dia alguém consiga transformar aquilo numa obra bonita, mas o que vimos foi um mostrengo de concreto que "enfeiou" mais o bairro.

Durante o passeio de hoje, me lembrei dos meus sábados da infância, quando ia à Jacarepaguá visitar os meus avós pela Barra da Tijuca. Naquele tempo, a Barra era bem mais deserta, tinha um ar de terra a ser conquistada, aquela coisa meio "conquista do oeste americano". E não é que o nosso povo encarnou bem esse espírito e está reproduzindo os EUA por lá direitinho? Não tem nada de carioca naquele lugar, sinto muito lhes dizer.

Nesta viagem que é lembrar da infância, dos passeios no fusca amarelo da minha tia, de nós quatro (meus dois primos, eu e minha irmã) de joelhos no banco de trás, brincando com todos os carros que passavam e seus respectivos motoristas, me dei conta de que as crianças de hoje já não podem fazer isso. Ninguém está mais para brincadeira, os rostos de hoje são tensos e sérios, preocupados com o assaltante que pode aparecer a qualquer momento, vindo não sei da onde (isso quando se consegue enxergar o rosto de alguém). Naquela época, ficávamos dando tchauzinho para os outros e rindo escondido, como se não houvesse amanhã. Meus primos ainda faziam questão de fazer a locução de uma Corrida Maluca da Catinga de Marapendi, porque naquela época a lagoa fedia à beça, e a gente dava risada. Eu devia ter o quê: cinco, seis anos?

Nos carros de hoje, o insulfilm nos vidros é tão escuro, mas tão escuro, que a gente não sabe dizer se quem está ao volante é homem ou mulher, se dentro do carro há um cachorrinho saltitante, se há alguma criança na cadeirinha, se há uma menina de lacinhos olhando pra gente... enfim, ficou tudo muito chato. É triste saber que toda uma população contaminou o seu astral com o medo da violência.
No fusca amarelo, a gente se divertia, na ida e na volta. Não tinha cansaço. Éramos quatro crianças e duas mulheres (minha mãe ia também) e a gente nunca passou nenhum aperto (a não ser quando a gente derrapou na curva do Jockey, num dia de muita chuva). Passar embaixo do Minhocão era uma festa, mas antes dele existir a gente vinha pela Gávea. O túnel Dois Irmãos ainda não estava ladeado pela Rocinha, e não havia aquela tensão no ar.

Eu não sei se esta sensação é de quem vai pouco lá. Acho que quem mora na Barra já nem nota a diferença. Mas, eu tenho saudades de um Rio de Janeiro mais lúdico, mais inocente e mais bonito.

Um comentário:

Letícia disse...

Também sinto saudades...